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29 DE AGOSTO DE 2023
Encontro ressalta o potencial da cooperação para viabilizar melhores decisões judiciais
A busca por fluidez, agilidade e eficácia no intercâmbio entre instituições da própria Justiça e também dos outros Poderes, em nome de uma jurisdição mais harmônica e colaborativa, reuniu, na manhã de segunda-feira (28/8), especialistas no Encontro Nacional de Magistrados(as) de Cooperação e na Reunião dos Núcleos e Magistrados(as) de Cooperação. Em comum, em todas as participações, o reconhecimento da importância do intercâmbio para intensificação do diálogo que renderá, ao cidadão, melhor acesso aos serviços para demandar pelos próprios direitos e, por fim, por decisões mais justas.
O evento, uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), atende a Resolução n. 350/2020, que estabelece diretrizes e procedimentos sobre a cooperação judiciária nacional entre os órgãos do Poder Judiciário e outras instituições e entidades. O encontro, presencial e on-line, também busca promover a disseminação de conhecimento e de boas práticas sobre cooperação judiciária. Por isso, a lista dos palestrantes trouxe representantes da Academia, do Poder Executivo, de agência de regulação, além de integrantes da magistratura e da advocacia.
O advogado e professor titular da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Fredie Didier Júnior defendeu a articulação para o diálogo, a fim de que a cooperação vá para além dos entes do Poder Judiciário. “Importante estender esse processo para os tribunais administrativos, para as agências reguladoras, para a advocacia pública”, enumerou. O palestrante argumentou que os casos de cooperação são diversos e que as possibilidades, infinitas: “Os grandes litígios, complexos, são exemplos de casos que envolvem milhares de processos e que mostram o caminho a ser tomado”.
Extinção de causas
Segundo o relato da procuradora nacional de trabalho e emprego da Procuradoria-Geral da União (PGU) e doutoranda em direito público, Mônica Casartelli, 80% dos mais de 70 mil processos relacionados à terceirização de serviços com que já teve de lidar envolviam valores até R$ 25 mil e 38% dessas demandas estavam abaixo dos R$ 15 mil. “Um acordo de redução de ligitiosidade extinguiu 20 mil causas”, disse. “O processo custa mais do que o próprio valor em discussão”, comentou o juiz auxiliar do Supremo Tribunal Federal (STF) e ex-conselheiro do CNJ, Mário Guerreiro, que presidiu uma mesa durante o encontro.
Outro exemplo de cooperação veio do empenho da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para, por meio dos editais para definição do acesso ao espectro para o tráfego de dados, promover a justiça digital. “Uma pequena falha nesses processos pode transformar aquilo que seria uma revolução digital em um número enormes de párias, de pessoas sem acesso aos serviços”, contou o conselheiro e diretor da Anatel, Alexandre Siqueira Freire. Com a adoção de balizas, novas propostas de modelos de negócio vieram das próprias empresas atuantes no mercado, mais aderentes ao que estava previsto nas regras da concorrência pública. “Foi uma espécie de mediação sem mediador que permitiu um novo posicionamento, uma visão conciliatória.”
Em outro painel, os palestrantes defenderam a harmonia para o bom andamento da recuperação judicial, para o soerguimento e a proteção dos credores. O juiz do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) Gustavo Quintanilha contou sobre a construção de um modelo de ato de cooperação que otimiza o quadro de credores trabalhistas. “Seria a semente para intercâmbio de um plano nacional de cooperação sobre o tema”, opinou. A advogada e mestre em direito processual Fernanda David considera fundamental a proteção de contratos e bens indispensáveis, de modo a trazer perenidade à atividade empresarial. “Uma vez requerida uma penhora, o juiz da recuperação judicial deve ouvir o juiz de execução sobre a essenciabilidade do bem.”
Processos estruturais
Já no painel “Processos estruturais e cooperação judiciária”, o professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) Osmar Paixão chamou a atenção para o fato de, nos casos de processos estruturais que contam com jurisdição única e objetivo comum, a cooperação implicar o risco de banalização, de um pragmatismo que levaria à vulgarização. “Esse recurso só deve ser usado nos casos máximos de necessidade, até porque há uma chance de conflito do Poder Judiciário com outros poderes, especialmente quando se trata de políticas públicas.”
Também em referência aos processos estruturais, houve o destaque da cooperação como instrumento para fazer frente à complexidade. “Para que tenhamos um procedimento que alcance o seu objetivo, é preciso flexibilidade, adaptação”, defendeu o coordenador-geral da atuação da Procuradora-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no Supremo Tribunal Federal (STF), Paulo Mendes. E a observação de litígios estruturais, por conta da espera para atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS) do Ceará, motivou que o último palestrante do terceiro painel da manhã, o juiz federal substituto Fabrício Borges, propusesse a adoção da figura de um juiz de contenção, ou juiz consultor, como interlocutor extraoficial. “Seria um terceiro, que procuraria aspectos negativos de um acordo que estaria por ser fechado numa demanda coletiva”, concluiu.
Litígios repetitivos e justiça multiportas
Nos dois últimos painéis de debate da parte da manhã, presididos pelo conselheiro Bandeira de Mello e pelo desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT da 7ª Região) Paulo Régis Botelho, os especialistas citaram situações em que a cooperação judiciária foi utilizada como instrumento para facilitar a resolução de conflitos.
O desembargador federal do TRF da 5ª Região Leonardo Resende Martins abordou a centralização de processos repetitivos para coordenar a liquidação do patrimônio de devedor único. Ele apresentou o caso da judicialização centralizada dada no processamento da Instituição Casa da Esperança, envolvendo tratamento de crianças com transtorno de espectro autista. Havia cerca de 200 ações pulverizadas em nove unidades judiciárias cearenses que envolviam a instituição, que apresentava problemas financeiros e trabalhistas, mas possuía expertise no atendimento àquelas crianças.
A incapacidade de absorção da demanda por outros prestadores de saúde do SUS obrigou o desembargador a pensar em uma solução que não inviabilizasse o atendimento daqueles vulneráveis e que também solucionasse as questões financeiras, garantindo o pagamento dos credores. “Tivemos de fazer uma análise de conveniência técnica para solucionar de maneira centralizada e adequada. Foram suspensas as ações individuais e criada apenas uma ação coletiva. Foi elaborado um plano de recuperação da casa, monitorado periodicamente, entre outras determinações”, disse.
A cooperação interinstitucional com os cartórios extrajudiciais foi o tema exposto pelo tabelião Renata Cortez, que trouxe diversos casos em que a cooperação minimizou a burocracia. Citou o artigo 16 da Resolução n. 350/2020. “Nada impede que órgãos, entidades e instituições, integrantes ou não do sistema de justiça, sejam considerados cooperantes interinstitucionais, desde que possam contribuir para a execução da Estratégia Nacional do Poder Judiciário, aprimorando a administração da Justiça, a celeridade e a efetividade da prestação jurisdicional.”
A cooperação judiciária para produção conjunta de prova foi outro ponto abordado nos debates. A advogada e mestre em direito processual Daniela Bermudes citou o desafio da uniformidade da solução para processos em que há alegações fáticas contrárias, e não apenas nas questões de repercussão coletiva. “Como garantir uma solução uniforme nesses casos? Precisaríamos ampliar o objeto de cognição do juiz para que ele conhecesse as outras questões envolvidas, o que poderia atrasar muito o processo”, disse.
Sobre o tratamento adequado de litígios repetitivos e a cooperação judiciária, a especialista em direito pela Universidade Federal do Pará (UFPA) Débora Vieira explanou a importância da cooperação judiciária nacional em Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), uma das inovações processuais trazidas pelo novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015) e sugeriu que o CNJ mapeasse e centralizasse os incidentes para orientar os tribunais a lidarem com as questões, instauradas em diferentes tribunais.
A possibilidade múltipla de cooperação judiciária interinstitucional com agências reguladoras foi o tema trazido pelo juiz do trabalho do TRT da 6ª Região e membro do Comitê Executivo de Cooperação Judiciária do CNJ Leandro Fernandez. Já o procurador regional da Fazenda Nacional na 5ª Região Alexandre de Andrade Freire abordou a boa experiência do órgão com o TRF da 5ª Região, com protocolos institucionais entre advocacia pública e tribunais.
Texto: Regina Bandeira e Luís Cláudio Cicci
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias
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