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21 DE NOVEMBRO DE 2022
Composição das instituições ainda não reflete diversidade social
As instituições públicas e privadas deveriam refletir, em sua composição, a diversidade étnico-racial da sociedade. Contudo, no Sistema de Justiça, em especial no Poder Judiciário, o quadro, segundo pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é de que apenas 12,8% da magistratura brasileira é negra (pretos e pardos), enquanto que em termos gerais, a população brasileira é formada por 56% de negros e negras. Os números foram apresentados durante o Seminário Nacional Simone André Diniz: Justiça, Segurança Pública e Antirracismo.
Ainda segundo os dados do CNJ, registrados na pesquisa “Negros e Negras no Poder Judiciário”, de 2021, 5% da magistratura é composta por mulheres negras, enquanto, na população geral, elas representam 28% do total. De acordo com Livia Sant’Anna Vaz, promotora de Justiça do Ministério Público da Bahia (MP-BA), esse perfil se repete por todo o Sistema de Justiça. “É preciso olhar para dentro, para sua composição e trazer uma diversidade, que será acompanhada de pluralidade na maneira de fazer Justiça a todas as pessoas”, completou.
O juiz auxiliar da Presidência do CNJ Edinaldo César Santos Junior destacou o pequeno aumento registrado no número de pessoas pretas na magistratura brasileira ao longo dos anos. Ele mostrou que, em 1996, foi realizada a primeira pesquisa institucional sobre o perfil dos magistrados e das magistradas brasileiros, no entanto, o levantamento não trazia nenhuma pergunta sobre a raça ou cor essas pessoas. Já em 2005, um levantamento da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) trouxe a questão pela primeira vez.
O magistrado destacou, a partir de sua trajetória, o estranhamento que causava a presença de negros, como ele, na carreira jurídica. A partir da presidência do ministro Joaquim Barbosa no Supremo Tribunal Federal (STF) e no CNJ, em 2014, começaram a ser trabalhadas ações afirmativas no Poder Judiciário, como a Resolução CNJ 203/2015, que reserva 20% das vagas da magistratura para negros, sendo a primeira política antirracista do Poder Judiciário.
O juiz apontou ainda que a pesquisa do CNJ em 2018 registrou não apenas o número de brancos (80,3%) e negros (18,1%) na magistratura, mas também o de amarelos (1,6%) e de 11 magistrados declarados indígenas. “Essa foi a primeira vez que conseguimos numerar a diversidade no Judiciário, ainda que ela não fosse expressiva”, declarou.
Em sua apresentação, o juiz citou também a Resolução CNJ 457/2022, que veda o estabelecimento de qualquer cláusula de barreira para candidatos negros nas provas objetivas em concursos públicos para a magistratura, e a importância do Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros (Enajum). Para ele, porém, ainda é necessário dar continuidade às políticas públicas inclusivas, destacando também os números referentes à participação feminina nas Cortes. “Precisamos ter a capacidade de ouvir as mulheres, enquanto homens; e ouvir os pretos, enquanto brancos”, pontuou.
Já a conselheira Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Silvia Souza, apontou que para vivenciar a aplicação do princípio da igualdade de forma simétrica é necessário reajustar as desigualdades sociais e raciais do país. “A raça deve ser tomada como elemento central para se pensar as políticas do sistema de justiça”, afirmou.
Silvia Souza disse ser fundamental que haja “políticas públicas para que possamos participar”, a fim de que haja paridade de gênero e equidade de raça nas composições. Lembrou que a OAB e alguns tribunais já adotam o critério de 30% para negros e 50% de mulheres para a formação das listas sêxtuplas para a composição do quinto constitucional – dispositivo constitucional que determina que um quinto das vagas de determinados tribunais brasileiros seja preenchido por advogados e membros do Ministério Público. “Pedimos que os tribunais usem das lentes antirracistas e façam escolhas equânimes. Do contrário, de nada adianta essa formação das listas”, pediu.
Racismo estrutural
O racismo institucional se reflete na insuficiência do Sistema de Justiça na forma de tratar a discriminação racial. Na visão dos defensores públicos que participaram do painel “O Acesso à Justiça e a Luta Antirracista”, há um abrandamento da legislação específica para criminalização do racismo, uma ineficácia do sistema criminal e a má vontade da Justiça ao analisá-los.
A promotora Livia Vaz do Ministério Público baiano destacou ainda que a legislação brasileira evoluiu, mas a prática, não. “O que observamos é o estabelecimento da impunidade ou de condescendência com a prática do racismo”, afirmou a promotora. A subnotificação também é uma realidade. Segundo o relatório da Corte Internacional de Direitos Humanos (CIDH), que analisou e julgou o Brasil no caso Simone André Diniz, de 1951 a 1997, de 300 boletins de ocorrência, apenas 150 geraram instauração de inquérito policial. Desses, apenas 40 geraram denúncias pelo Ministério Público, e apenas nove casos foram a julgamento.
Na análise do caso Simone André Diniz, há um entendimento de que o racismo institucional promove uma falha coletiva para prover o serviço ao jurisdicionado por razão de raça, cor e etnia. Para tratar o problema, no entanto, os defensores disseram ser necessário reconhecer limitações e identificar posturas que legitimam o racismo.
Além disso, é preciso estabelecer medidas afirmativas, com a capacitação continuada sobre a temática e a preparação de negros, a partir das escolas de magistratura e da própria Defensoria, para que possam ser aprovados nos concursos das instituições.
Os painelistas também apontaram que a discussão racial no Judiciário está atrasada em relação a outras áreas, como na saúde e educação, por exemplo. A situação corrobora com a ideia de que os operadores do direito ainda estão distantes da sociedade, não apenas na representação diversificada, espelhando a sociedade, quanto no acolhimento aos problemas reais da comunidade.
Também foi proposto abordar a temática a partir da governança, para que possa reorganizar as medidas institucionais de discriminação racial, a capacitação e as pesquisas a respeito da problemática. Para a advogada, coordenadora de Políticas de Promoção da Igualdade de Gênero e Raça da Geledés Instituto da Mulher Negra, Maria Sylvia Aparecida de Oliveira, o acesso à Justiça é direito fundamental. “É preciso enfatizar que o povo negro luta pelo direito de ter direito; segue na luta por dignidade, igualdade e liberdade”, defendeu.
Texto: Lenir Camimura e Tatiana Vaz
Edição: Jônathas Seixas
Agência CNJ de Notícias
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